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A operação "lava a jato", o impeachment e cassação do mandato de Dilma, o governo "tampão" de Temer e, por último, a inusitada eleição de Bolsonaro para a presidência da República foram fatores que provocaram um verdadeiro terremoto político no Brasil. Diante da magnitude do abalo sísmico, todas as forças políticas do país se desarticularam e, hoje, quase nenhum analista político consegue mapear o atual momento e, menos ainda, arriscar palpite para o futuro. Nesse sentido, a entrevista do professor Christian Lynch, da UERJ, ao jornal espanhol "El País", representa uma vela num mar de escuridão. Pela sua importância, a seguir, reproduzo e comento os principais trechos dessa entrevista.
Segundo ele, na última década, o Brasil assistiu à gestação, apogeu e declínio de uma "revolução judiciarista" - processo de politização do Judiciário e do Ministério Público, ocupando o vácuo do apodrecimento do sistema político. Antes, o STF se limitava a exercer o poder moderador e proteger a democracia dos exageros autoritários, como um guardião dos valores republicanos. Mas, após assumir a hegemonia até então exercida pelo Exército, a partir da Constituição de 1988, o Judiciário gradativamente extrai atribuições de outros poderes. A "lava a jato" deixou terra arrasada na política. Depois de devastar os poderes Executivo e Legislativo, restou apenas o Judiciário, que se dividiu e também se desmoralizou.
E qual o papel de Sérgio Moro, o "super-herói" da "lava jato", nesse cenário? Moro se reposicionou. Antes, ele era percebido pela maioria das pessoas como juiz suprapartidário, liberal, de centro, na linha de frente do combate à corrupção. Ao aceitar um cargo no ministério, ele se afasta da figura de juiz e leva a operação "lava jato" para o colo do bolsonarismo. Mas foi a partir da divulgação das mensagens pelo The Intercept que o ministro ficou mais à vontade. Aderiu de vez ao bolsonarismo e se tornou um reacionário.
Diante do fracasso da "revolução judiciarista", o que podemos esperar da política hoje? Com Lula preso, a esquerda se mostra impotente para fazer frente ao bolsonarismo. Enquanto o PT esteve no poder, principalmente nos governos Dilma, houve acúmulo de desgastes e brigas com muitos aliados. Aplica-se, neste caso, a maldição de Sólon (legislador grego): "quem é temido por muitos, deve temer a muitos". Por enquanto, o único plano da esquerda parece ser esperar Lula ser solto para saber qual é o próximo passo. A esquerda ficou acéfala. Só vai conseguir se articular outra vez quando a atual situação se desgastar.
Na opinião do professor, Bolsonaro e seus filhos estão na extrema direita do espectro político brasileiro. Se o atual governo sair da extrema direita para a direita tradicional em 2022, já terá sido um grande avanço. Bolsonaro não tem projeto de governo, mas apenas de poder. Seu único plano é manter o domínio sobre 30% do eleitorado e se tornar uma espécie de Lula de direita nos próximos anos. Isso coloca o PT numa espécie de "beco sem saída": o partido está obrigado à radicalização, caso queira manter a hegemonia da esquerda. Isso se torna difícil pelo atual cenário de polarização política. As mensagens vazadas pelo The Intercept têm uma repercussão muito menor do que poderiam ter para mudar a opinião pública. As pessoas se tornaram resistentes aos fatos. Não existe mais verdade. Essa é a arma de combate cotidiano da extrema direita.